Monday, March 20, 2006

Wagner Geribello, outubro de 2005

Máximo e mínimo



Retiro forçado por questões de saúde me colocou fora das últimas edições de Semana 3. Retorno retomando o tema da crise política que, infelizmente, foi (é) maior, no tempo e no espaço, que meu involuntário afastamento.

Abarrotada de crise, a mídia, no geral, tem apontado fatos e desdobramentos como conseqüência exclusiva do comportamento errado e dos erros de condução das agremiações que ora ocupam o Governo Federal, Partido dos Trabalhadores à frente, tratando a oposição (elite político-econômica liberal) como simples observadora passiva do processo, isenta de planejamento e ações no sentido de empurrar de vez a situação para o buraco.

Assim, o comportamento da grande imprensa nem sempre deixa ver que a direita não tem se furtado ao impulso de empurrar a banqueta sobre a qual a esquerda está apoiada, após enrolar no próprio pescoço a corda da improbidade, atada com o nó da incompetência. Apoiada em fórmulas maniqueístas, a mídia tem reservado manchetes para os desmandos criminosos da esquerda, enquanto relega pouco espaço para evidências que ajudem esclarecer quanto a direita deixa de perder com a fragilização da esquerda e como isso reflete no contexto político, social e econômico do país.

Confira alguns itens que vão ou foram “pras cucuias” por conta da desmoralização das forças políticas de esquerda e da conseqüente queda da sua capacidade de influir nos destinos do País e cuja alteração favorece muito o projeto liberal.

TV digital. Sai de vez a tese do desenvolvimento de tecnologia brasileira, substituída por aquisições no mercado internacional, independente da dependência que acompanha a decisão, implicando em mais sucateamento dos recursos nacionais de pesquisa, fuga de cientistas e volta à dependência crescente da ciência alienígena, ao preço e às ordens dos centros hegemônicos.

Privatizações. Interrompidas e, em certos casos, questionadas pelo atual governo, voltam à baila com o fortalecimento do poder liberal, inclusive com alguns itens já definidos, como educação (abertura ao capital estrangeiro e proliferação descontrolada do ensino pago) e recursos hídricos (captação, tratamento e distribuição).

Comunicações. Consolidação de agências reguladoras e legislação favorável à democratização dos meios e recursos, timidamente ensaiadas na atual gestão, desaparecem das pautas de governo. Independente de conseqüências sociais e culturais, o mercado volta a regular (?) produção cinematográfica, concessões de transmissão (rádio e tv) e coisas que tais.

Informática. Vira passado, sem nunca ter sido presente, a possibilidade de substituir a base Microsoft por programas abertos na esfera governamental, assentando passos na direção da independência e da economia. Comandados da mega-empresa americana, atuando aqui em Pindorama, ficam livres para impor compra e uso “ad aeternum” dos badulaques virtuais de mister Gates.

Controle rígido dos desmandos capitalistas. Coisas como a investigação da “enrolação Daslu”, com direito a prisão de contraventores, independente de conta bancária e amizades influentes podem voltar a ser substituídas pelo vale tudo do mercado, em que “gente de negócio”, em princípio e por “lei natural”, está isenta de culpa e dispensada de investigação.

Políticas sociais. Soterramento da universalização, para adoção definitiva e integral da política focada, é o caminho sob o domínio liberal, sugerindo, sem exigir, que, na medida das possibilidades, mas não obrigatoriamente de acordo com as necessidades, o setor privado (travestido de “terceiro setor”) se encarregue do “esmolismo” aos pobres e desamparados, porque, ocupado com a Casa Grande, o governo não pode cuidar de azares e mazelas da senzala.

Geoestratégia. Mesmo tímidas e débeis, tentativas de reordenar o cenário internacional, ajustando esforços entre iguais (cognominados países em desenvolvimento), no ver e no fazer liberal atrapalham em demasia o mercado, de modo que bom mesmo é manter a condição periférica em nome do pragmatismo econômico e do “realismo” diplomático.

A lista poderia ir seguindo, mas já basta para mostrar que à maximização de alguns fatos (manchetes, retumbância, chamadas, o show da mídia), corresponde a minimização de outros (notas, parcas pé de página, sem análise nem destaque) apesar da importância similiar entre ambos. No entanto, ao primeiro reclamo de que o descalabro do descalibre põe em xeque a isenção jornalística, vozes “zelosas” determinam que isso tudo não passa de tese conspiratória e alarmismo infundado, pois a mídia continua, sim, neutra e equilibrada... a bem da verdade.

(Publicado originalmente na edição 34, de outubro de 2005, da revista Semana 3)

1 Comments:

Anonymous Anonymous said...

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5:45 AM  

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