Delfin, novembro de 2005
Cem anos de Tico-Tico
Cem anos é muita coisa. Quando o objeto do centenário é importante, então, é mais coisa ainda. Pode-se seguir por qualquer lado para se analisar: importância histórica, referência pessoal, influências em áreas do conhecimento humano, enfim, muitos viéses.
Ano que vem, por exemplo, é o centenário do vôo histórico do 14 Bis, que notabilizou Santos Dumont, em boa parte do mundo, como o verdadeiro pai da aviação. Um vôo que, na verdade, será comemorado gloriosamente, com a ida do primeiro homem brasileiro ao espaço.
Aqui em terra mesmo, há mais centenários acontecendo. No futebol, por exemplo, é a vez do aniversário do Boca Juniors, do Chelsea e também, por que não?, do Sport Recife. Na literatura, o centenário é de Júlio Verne, ainda que eclipsado pelo quarto centenário do Dom Quixote. Mas também faz cem anos que outras coisas começaram a rolar no mundo, como o picolé, o teste de QI e o avião (pois, sim!, o 14 Bis foi inventado por Santos Dumont um ano antes, ele só não havia decolado ainda).
E os quadrinhos, será que tem o que comemorar neste ano cheio de centenários dignos de nota? Certamente sim. Um internacional, que chama mesmo a atenção de todos, e um nacional, que merecia mesmo ser lembrado.
Os cem anos do primeiro aventureiro do mundo dos sonhos, o ainda insuperável Little Nemo, é o mais importante, sem dúvida. Criação de Winsor McCay, um dos grandes gênios que o mundo dos quadrinhos já viu, a série revolucionou os conceitos ainda incipientes de roteiro e desenho da época, catapultando a qualidade de ambos para alturas ainda impensáveis para um tipo de arte publicada em jornais mal impressos e com coloração sofrível. Mas Nemo (que quer dizer ninguém) era muito mais impressionante do que se poderia crer que fosse possível. Por isto mesmo é até hoje cultuado por grandes artistas de muitos meios, como, por exemplo, Neil Gaiman e Phil Collins.
Já o centenário nacional é o da primeira pu¬bli¬ca¬ção infanto-juvenil de quadrinhos daqui, O Tico-Tico. Responsável pela formação de pelo menos três gerações de crianças, o semanário trazia a qualidade editorial do jornal que lhe deu origem, “O Malho”, e também a grande ca¬pa¬ci¬da¬de dos autores nacionais, principantes na área, em expandirem rapidamente o universo ficcional infantil.
Homenagens ao jornal/revista, que che¬gou a ul¬tra¬pas¬sar os primeiros cinqüenta anos de sua vida nas bancas, começam a aparecer. No Rio de Janeiro, por exemplo, uma exposição magnífica retratou a história d’O Tico-Tico, com grande pre¬ci¬são e muitos originais, numa verdadeira aula da história das HQs brasileiras.
Na última semana, também chegou às livrarias a edição “O Tico-Tico: cem anos de história”, de Ezequiel de Azevedo, pela editora Via Lettera. Mas o livro, de apenas 64 páginas, tem inúmeras falhas de pesquisa, é incompleto e superficial perto da história de uma publicação que passou dos cinqüenta anos em circulação. O que faz muita gente pensar se o autor (cuja biografia é sequer citada) não quis mesmo tirar uma casquinha com este material visivelmente apressado.
Ao contrário, a editora Opera Graphica, que deu um tremendo salto de qualidade nos últimos anos, promete um verdadeiro compêndio sobre O Tico-Tico, que só não chegou ainda às livrarias por conta do caro zelo do editor Franco de Rosa pela correção das informações textuais e visuais do álbum. Se for assim, a homenagem se torna justa. A história das HQs merece qualidade. O oportunismo editorial? Podemos ficar sem.
(Publicado originalmente na edição 35, de novembro de 2005, da revista Semana 3)
Cem anos é muita coisa. Quando o objeto do centenário é importante, então, é mais coisa ainda. Pode-se seguir por qualquer lado para se analisar: importância histórica, referência pessoal, influências em áreas do conhecimento humano, enfim, muitos viéses.
Ano que vem, por exemplo, é o centenário do vôo histórico do 14 Bis, que notabilizou Santos Dumont, em boa parte do mundo, como o verdadeiro pai da aviação. Um vôo que, na verdade, será comemorado gloriosamente, com a ida do primeiro homem brasileiro ao espaço.
Aqui em terra mesmo, há mais centenários acontecendo. No futebol, por exemplo, é a vez do aniversário do Boca Juniors, do Chelsea e também, por que não?, do Sport Recife. Na literatura, o centenário é de Júlio Verne, ainda que eclipsado pelo quarto centenário do Dom Quixote. Mas também faz cem anos que outras coisas começaram a rolar no mundo, como o picolé, o teste de QI e o avião (pois, sim!, o 14 Bis foi inventado por Santos Dumont um ano antes, ele só não havia decolado ainda).
E os quadrinhos, será que tem o que comemorar neste ano cheio de centenários dignos de nota? Certamente sim. Um internacional, que chama mesmo a atenção de todos, e um nacional, que merecia mesmo ser lembrado.
Os cem anos do primeiro aventureiro do mundo dos sonhos, o ainda insuperável Little Nemo, é o mais importante, sem dúvida. Criação de Winsor McCay, um dos grandes gênios que o mundo dos quadrinhos já viu, a série revolucionou os conceitos ainda incipientes de roteiro e desenho da época, catapultando a qualidade de ambos para alturas ainda impensáveis para um tipo de arte publicada em jornais mal impressos e com coloração sofrível. Mas Nemo (que quer dizer ninguém) era muito mais impressionante do que se poderia crer que fosse possível. Por isto mesmo é até hoje cultuado por grandes artistas de muitos meios, como, por exemplo, Neil Gaiman e Phil Collins.
Já o centenário nacional é o da primeira pu¬bli¬ca¬ção infanto-juvenil de quadrinhos daqui, O Tico-Tico. Responsável pela formação de pelo menos três gerações de crianças, o semanário trazia a qualidade editorial do jornal que lhe deu origem, “O Malho”, e também a grande ca¬pa¬ci¬da¬de dos autores nacionais, principantes na área, em expandirem rapidamente o universo ficcional infantil.
Homenagens ao jornal/revista, que che¬gou a ul¬tra¬pas¬sar os primeiros cinqüenta anos de sua vida nas bancas, começam a aparecer. No Rio de Janeiro, por exemplo, uma exposição magnífica retratou a história d’O Tico-Tico, com grande pre¬ci¬são e muitos originais, numa verdadeira aula da história das HQs brasileiras.
Na última semana, também chegou às livrarias a edição “O Tico-Tico: cem anos de história”, de Ezequiel de Azevedo, pela editora Via Lettera. Mas o livro, de apenas 64 páginas, tem inúmeras falhas de pesquisa, é incompleto e superficial perto da história de uma publicação que passou dos cinqüenta anos em circulação. O que faz muita gente pensar se o autor (cuja biografia é sequer citada) não quis mesmo tirar uma casquinha com este material visivelmente apressado.
Ao contrário, a editora Opera Graphica, que deu um tremendo salto de qualidade nos últimos anos, promete um verdadeiro compêndio sobre O Tico-Tico, que só não chegou ainda às livrarias por conta do caro zelo do editor Franco de Rosa pela correção das informações textuais e visuais do álbum. Se for assim, a homenagem se torna justa. A história das HQs merece qualidade. O oportunismo editorial? Podemos ficar sem.
(Publicado originalmente na edição 35, de novembro de 2005, da revista Semana 3)
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