Bruno Ribeiro, junho de 2004
Meu primeiro porre de mojito
Ébrios leitores!
Certa vez, em Cuba, tomei um porre homérico de mojito (pronuncia-se "morrito") no La Bodeguita, botequim preferido de Fidel Castro. Aliás, Fidel deve ser o único cubano a beber por ali, tal a quantidade de turistas por metro quadrado. No caminho para o banheiro fui esbarrando no alemão, tomei cotovelada do japonês, tropecei no italiano, dei um jogo de corpo no argentino (nesse, o empurrão foi proposital).
Depois do quinto mojito, saí cantando uma velha marchinha de carnaval: "Brasil vai lançar foguete/ Cuba vai lançar também/ Lança, Cuba, Cuba lança/ quero ver Cuba lançar". No que fui repreendido por Anita, uma morena espetacular que me acompanhou na beberagem: "Compañero, por favor..." Foi minha única recaída de turista, confesso.
Turista é uma coisa deplorável. Ainda bem que não nasci com essa vocação. Sabe como identificar um gringo nas praias do Rio? É aquele cara de camisa florida e chapéu cata-ovo. O tipo vem ao Brasil supondo que todos por aqui saem de casa com as camisas ridículas que ele via nos filmes da Carmem Miranda. Da mesma maneira que, ao chegar em Cuba, a primeira coisa que o turista tem de fazer para não passar como tal é evitar camisetas do Che Guevara.
No La Bodeguita foi fácil beber de graça. Brasileiro tem uma vantagem: pode ser oriundo (oriundo é ótimo) de qualquer país do mundo, porque tem cara de povo. De qualquer povo. Sobretudo cara de cubano, por conta dos laços de sangue que nos unem. Depois do terceiro mojito começou a chegar bebida na minha mesa. A dona da bodega - a Célia Cruz, só que ruiva -, sussurrou entre dentes, enquanto botava na conta dos gringos: "Tranquilo, brasileño, estes están pagando los yankes". Sorri, embevecido, sentindo-me em casa: "Gracias, mi madre! No sabia que en Cuba ustedes también tenian el jeitinho brasileiro".
Anita, sempre vigilante, conduziu-me ao táxi. Antes, porém, combinou a corrida com o chofer e murmurou-me ao pé do ouvido: "Todo bien que tu eres cubano, pero hable solo el indispensable". Ao taxista perguntei o indispensável sobre a origem do mojito, este drinque fantástico. E ele contou-me que a mistura de hortelã com rum teria sido criada por um inglês, em alto-mar. Até táxi, em Cuba, é cultura.
Ninguém sabe se a história é verdadeira, mas quem a narrava, no balcão do La Bodeguita, era ninguém menos que o escritor norte-americano Ernest Hemingway. Segundo ele, o almirante e aventureiro inglês Francis Drake, o primeiro homem branco a aportar em ilhas do Pacífico Sul, teria tido a idéia de misturar a planta com boas doses de rum. A desculpa: a mistura seria a ideal para proteger os marujos dos problemas respiratórios e estomacais, tão comuns nas grandes travessias marítimas.
Com o estômago levemente embrulhado, devido à azeitona da empada, convidei o taxista para uma saideira. Em troca, ele me forneceu a receita secreta do mojito.
(Publicado originalmente na edição 24, de junho de 2004, do jornal Semana 3)
Ébrios leitores!
Certa vez, em Cuba, tomei um porre homérico de mojito (pronuncia-se "morrito") no La Bodeguita, botequim preferido de Fidel Castro. Aliás, Fidel deve ser o único cubano a beber por ali, tal a quantidade de turistas por metro quadrado. No caminho para o banheiro fui esbarrando no alemão, tomei cotovelada do japonês, tropecei no italiano, dei um jogo de corpo no argentino (nesse, o empurrão foi proposital).
Depois do quinto mojito, saí cantando uma velha marchinha de carnaval: "Brasil vai lançar foguete/ Cuba vai lançar também/ Lança, Cuba, Cuba lança/ quero ver Cuba lançar". No que fui repreendido por Anita, uma morena espetacular que me acompanhou na beberagem: "Compañero, por favor..." Foi minha única recaída de turista, confesso.
Turista é uma coisa deplorável. Ainda bem que não nasci com essa vocação. Sabe como identificar um gringo nas praias do Rio? É aquele cara de camisa florida e chapéu cata-ovo. O tipo vem ao Brasil supondo que todos por aqui saem de casa com as camisas ridículas que ele via nos filmes da Carmem Miranda. Da mesma maneira que, ao chegar em Cuba, a primeira coisa que o turista tem de fazer para não passar como tal é evitar camisetas do Che Guevara.
No La Bodeguita foi fácil beber de graça. Brasileiro tem uma vantagem: pode ser oriundo (oriundo é ótimo) de qualquer país do mundo, porque tem cara de povo. De qualquer povo. Sobretudo cara de cubano, por conta dos laços de sangue que nos unem. Depois do terceiro mojito começou a chegar bebida na minha mesa. A dona da bodega - a Célia Cruz, só que ruiva -, sussurrou entre dentes, enquanto botava na conta dos gringos: "Tranquilo, brasileño, estes están pagando los yankes". Sorri, embevecido, sentindo-me em casa: "Gracias, mi madre! No sabia que en Cuba ustedes también tenian el jeitinho brasileiro".
Anita, sempre vigilante, conduziu-me ao táxi. Antes, porém, combinou a corrida com o chofer e murmurou-me ao pé do ouvido: "Todo bien que tu eres cubano, pero hable solo el indispensable". Ao taxista perguntei o indispensável sobre a origem do mojito, este drinque fantástico. E ele contou-me que a mistura de hortelã com rum teria sido criada por um inglês, em alto-mar. Até táxi, em Cuba, é cultura.
Ninguém sabe se a história é verdadeira, mas quem a narrava, no balcão do La Bodeguita, era ninguém menos que o escritor norte-americano Ernest Hemingway. Segundo ele, o almirante e aventureiro inglês Francis Drake, o primeiro homem branco a aportar em ilhas do Pacífico Sul, teria tido a idéia de misturar a planta com boas doses de rum. A desculpa: a mistura seria a ideal para proteger os marujos dos problemas respiratórios e estomacais, tão comuns nas grandes travessias marítimas.
Com o estômago levemente embrulhado, devido à azeitona da empada, convidei o taxista para uma saideira. Em troca, ele me forneceu a receita secreta do mojito.
(Publicado originalmente na edição 24, de junho de 2004, do jornal Semana 3)
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